O
Direito pode ser demonstrado quanto à natureza, aos fins e às práticas jurídicas e sociais.
Quanto
à sua natureza, entende-se o Direito a partir de um conceito cultural, nascido
das práticas sociais que interagem na sociedade, de uma realidade referida a
valores, de uma realidade cujo sentido é achar-se ao serviço de certos valores,
conforme teoriza Miguel Reale (Teoria Tridimensional do Direito. p. 94.).
É
importante observar que o Direito é um instrumento a serviço da ideologia de
seu povo para a realização de um bem comum, onde o conceito de Direito acha-se
dependente da ideia de Direito.
A
ideia de Direito, por sua vez, tem correlação com a ideia de justiça. A justiça
é o ponto de partida para o conceito de Direito, tendo em vista que o fim do
Direito é o homem, a justiça e a paz social. Direito, portanto, é um
instrumento, um modelo criado pelo ser humano para organizar a sociedade, com a
finalidade descrita acima, através de leis, as quais se apresentam como uma
forma de explicar e balizar a conduta humana.
Adão
Longo vai além, ao afirmar que o “Direito não é só a lei, a norma de conduta na
vida social. O Direito é mais que isso: é a humanização da Justiça. Antes mesmo
de ser uma obra corporificada do homem, o Direito já existe como figura ideal,
segura e necessária ao relacionamento humano. Tanto assim que, malgrado a
incineração de todos os códigos ou a violação de todas as leis, o Direito
subsistirá sempre como uma essência da vida social” (O direito de ser humano. p.
26).
Mas
o que se entende por justiça? Apesar de ser uma figura abstrata, idealizada
pelo homem, justiça pode ser entendida sob dois aspectos: a) a justiça, no sentido subjetivo, é ser moralmente bom (Moral);
tem relação entre homens; não se mede pelo Direito positivo - vai além da
regra, sendo justiça como ideal político de liberdade e de igualdade; tem
sentido de valor. b) a justiça, no
sentido objetivo, pode ser identificada mediante a observação de alguns
critérios, atribuíveis à lei: 1)
quando há correspondência entre o conteúdo da lei e a demanda social; 2) Quando a lei visa garantir igualdade
de direitos; 3) Quando a lei
identifica-se com o próprio fato gerador (critério de verdade); 4) Justiça como legitimidade ética.
Melo
explica que Clarence Morris, retomando a ideia trazida por Aristóteles (teoria
da vontade geral) e mesmo não trazendo critérios que possam identificar as
“genuínas e importantes” aspirações da sociedade, constrói sua teoria com uma
exposição clara e objetiva.
O
segundo critério pode ser atribuído, modernamente, a doutrina contratualista de
John Rawls, para quem a justiça deve ter por ideal político a liberdade e a
igualdade, no sentido social mais amplo possível:
Primeiro, cada pessoa deve ter a mais ampla liberdade,
sendo que esta última deve ser igual à dos outros e a mais extensa possível, na
medida em que seja compatível com uma liberdade similar de outros indivíduos.
Segundo, as desigualdades econômicas e sociais deve ser combinadas de forma a
que ambas correspondam à expectativa de que trarão vantagens a todos e que
sejam ligadas a proposições a órgãos abertos a todos (Uma teoria da justiça. p.
67).
A
terceira ideia, segundo Melo (op. cit. p. 112), tem por objetivo arbitrar o justo e o injusto em
razão do conhecimento do verdadeiro ou do falso que fundamente a norma (adequatio intelectus et rei). Os falsos
fundamentos da norma as tornam injustas.
Por
fim, a quarta concepção de justiça exige a coexistência harmoniosa entre a
norma de Direito e a norma de Moral. Este conceito parte do entendimento de que
a consciência Jurídica identifica a justiça da norma com uma obrigação moral do
agir, que a mesma deve prescrever. Sendo o conteúdo de uma norma um pressuposto
para o juízo do justo, pode-se afirmar que não há justiça que não seja uma
valoração ética (MELO, Osvaldo Ferreira de. op. cit. p.113/114).
Importante
salientar que não é apenas o senso de justiça que deve ser realizado pelo
Direito. Há, também, a ideia de utilidade, que mesmo distante do conteúdo ético
e moral da norma, apresenta-se de suma importância quando se trata de normas
técnicas, organizacionais (normas de trânsito, a ABNT etc.). Estas, por não
terem um conteúdo que se relacionem com os desejos e valores sociais, são
necessárias para a complementação da regulamentação e sua utilidade social é
quem vai lhe atribuir o caráter de legítimas ou ilegítimas.
Assim,
o sentido do Direito implicaria obrigatoriamente na aglutinação do sentido de
justiça (dos valores referenciais) e do sentido de utilidade social, dos fins
que ele, o Direito, deva e possa alcançar (MELO, Osvaldo Ferreira de. Op. cit.
p. 105).
Desta
forma, quanto aos fins, o Direito pode ser demonstrado como um instrumento em
busca da justiça e da paz social.
No
tocante às práticas sociais e jurídicas, o Direito demonstra-se na ideia de que
tem origem nas práticas sociais, onde a sua exteriorização, a norma, deve ser
legitimada pela sociedade e o sentimento de justiça deve sempre estar presente
na lei e na decisão proferida pelos seus operadores.
Por
fim, cabe realçar as características do Direito. Apesar de atribuírem-no como
características a exterioridade, a heteronomia, a coação e a bilateralidade,
apenas a imperatividade e a exigibilidade são atribuíveis
exclusivamente ao Direito.
A exteriorização – regula a conduta
exterior dos homens – não é uma característica sempre presente no Direito, que
também pode regular as condutas interiores, na medida em que anuncia ou deixa
esperar uma conduta exterior. Ex: diferentes formas de culpa e a boa-fé; o
perigo Moral a um menor já autoriza a intervenção e proteção do Estado (RADBRUCH, Gustav. Filosofia do Direito. p.
179).
A heteronomia – homem necessariamente
obrigado a obedecer regras postas por outrem – também não é impreterível. Para
Reale (Filosofia do Direito, p. 286), o Direito também pode ser autônomo
(inerente à Moral) quando as regras são postas pelo indivíduo ou reconhecidas
espontaneamente por ele. Pode haver cumprimento de regra jurídica com plena
correspondência entre a “vontade da lei” e a “vontade do obrigado”.
A coação, para Kant e Jhering, é elemento
necessário e intrínseco ao Direito. Já para Thomasius o Direito não se realiza
sempre pela força, podendo haver a realização espontânea. Deve ser diferenciada
a coação no sentido de coercível (coercibilidade) – estado latente, em potencial
(Thomasius, Reale) – da coação no sentido de coercitivo (coercitividade) –
coerção sem a qual não haveria Direito (Kant e Jhering).
A
coação também se apresenta como característica da religião, dos costumes, não
sendo, portanto, exclusiva da norma jurídica.
Já
a imperatividade e a exigibilidade são características exclusivas do Direito,
na medida em que a aplicação da norma jurídica é destinada a todos,
indistintamente, a qual deve ser obrigatoriamente observada, estando amparada
pelo império do Estado.
A
exterioridade, a heteronomia, a coação e a bilateralidade, como tantas outras,
podem ser vistas como adjetivos do Direito.