quarta-feira, 24 de abril de 2013

O BRASILEIRO CUMPRE LEI?



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Pesquisa realizada pela Fundação Getúlio Vargas, sobre a percepção do cumprimento de regras no Brasil, demonstra alguns dados interessantes e preocupantes.


Inúmeras conclusões podem ser tiradas de referida pesquisa, como, por exemplo, que o brasileiro compreende que fazer os atos pesquisados é errado, porém mesmo assim os pratica.
O estudo mostra que 94% dos pesquisados disseram que acham errado atravessar a rua fora da faixa de segurança, contudo 72% assumiram que já fizeram isso nos últimos 12 meses. E assim com a compra de CD e DVD pirata (91% acham errado e 60% dizem ter feito), dirigir depois de consumir bebida alcoólica (99% acham errado e 14% assumem ter feito).
Também chama a atenção o percentual de brasileiros que diz ser fácil desobedecer às leis no Brasil (82%), enquanto que 79% acham que o brasileiro sempre que possível, opta pelo “jeitinho” ao invés de seguir a lei.
Porém o que mais nos chama à reflexão é o percentual de pessoas que assumem existir poucas razões para uma pessoa (como ela) seguir a lei (54%).
Este dado é extremamente preocupante e acende um sinal de alerta, justamente porque evidencia que muitas pessoas se acham “autorizadas” a descumprir uma norma jurídica. A pesquisa não demonstra qual é a lei que o entrevistado se acha no direito de descumprir (se penal, civil, administrativa ou de trânsito), contudo nos exige algumas reflexões, especialmente no campo penal, ainda mais neste período em que alguns setores “desavisados” da sociedade trazem à discussão a redução da maioridade penal.
Se pensarmos que 54% dos brasileiros se sentem autorizados a descumprir uma lei penal, evidente que não será através da criminalização de condutas (criação de novos tipos penais), da ampliação do encarceramento (redução da maioridade penal), que os índices de criminalidade (ou descumprimento da lei) serão reduzidos.
O problema está muito além do direito e quicá do direito penal. Penso que esses dados refletem a condição moral de um povo, afeto ao “jeitinho” para conseguir o que quer, mesmo que para isso tenha que ir contra a norma.
Em uma narrativa genial, Fiódor Dostoiévshi, em Crime e Castigo, retrata o personagem de Raskólnikov, estudante em precárias situações econômicas e financeiras, que se acha no direito (moral) de praticar um assassinato. Entende ele que a sua condição humana lhe autoriza a praticar referido crime.
Nos parece que este dilema retratado por Dostoiévshi se reproduz na sociedade brasileira, onde 54% dos entrevistados assumem não ter motivos (morais) para seguir a lei. É como se essas pessoas estivessem imunes às normas e suas condições pessoais lhes autorizassem a praticar algum ilícito. Repito, não temos como saber se estas pessoas se sentem autorizadas a praticar infrações penais ou apenas infrações administrativas/trânsito, mas não deixa de ser um indicativo precioso (e triste) e que deve ser levado em consideração quando da elaboração de leis penais, especialmente aquelas que criminalizam novas condutas e aumentam a pena das já existentes, sob o discurso de que isso fará com que o fato social (agora criminalizado) ou o crime (agora com pena mais alta) deixe de ser praticado.

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Incêndio na Boate Kiss e a banalização do dolo eventual


Tenho uma certa resistência em aceitar algumas decisões. A banalização do dolo eventual pelo judiciário, para atender ao clamor público, tem causado espécie.


Neste caso específico (incêndio na Boate Kiss), não há como compreender que os acusados por homicídio doloso (dolo eventual) tenham aceitado o resultado final. Se vocês observarem no slide (click) que está atrás dos promotores que concedem a entrevista, verão que o dolo eventual exige a previsão do resultado e aceitação dele. Ou seja, não basta eu prever o resultado morte, mas de alguma forma aceitar que ele ocorra. Exemplificando de forma bem simplista, seria como se os acusados tivessem consciência de que o incêndio poderia ocorrer (previsão) e pensassem, "não tem problema, se ocorrer e tiver vítima não me importo" (aceitação). 

Não conheço o inquérito policial que apurou o fato, mas fico imaginando como a polícia conseguiu demonstrar que os 4 acusados tenham aceitado o resultado morte, ou não se importaram que isso pudesse ocorrer. Ao menos que eles tenham confessado em seus depoimentos, de outra forma é muito difícil, senão quase impossível provar a aceitação do resultado, por que isso, na maioria das vezes, fica no íntimo da pessoa, ninguém sai por aí falando que quer o resultado. Talvez alguns atos possam demonstrar a aceitação deste resultado, mas convenhamos, alguém ali desejava que a tragédia fosse ocorrer? 

Não há dúvida que estão fazendo tábua rasa da teoria do dolo eventual, da mesma forma que fazem nos homicídios ocorridos em acidente de trânsito.

Antes que alguém se manifeste, não estou aqui querendo impunidade, mas apenas que a punição seja dada, se for o caso, dentro dos parâmetros legais e teóricos (teoria do delito).