Características
da Moral e da Ética
A Moral e a Ética
invariavelmente são confundidas e até mesmo vistas como sinônimos.
Segundo Osvaldo Ferreira de
Melo, Moral é: “1) Conjunto de princípios e de padrões de conduta de um
indivíduo, de um grupo ou de uma coletividade. 2. Conjunto de regras
decorrentes dos costumes e da recepção das virtudes valoradas pelo grupo
social. Impropriamente a palavra é usada como sinônimo de Ética (V.)” (Dicionário de Política Jurídica. p. 28).
Pode-se afirmar que a Moral é a construção
espiritual do ser humano, não sendo possível ser codificada, constituindo-se em
patrimônio pessoal, estando ligada ao agir individual em correspondência com os
valores de seu universo. Também, em um contexto mais amplo, a Moral corresponde
aos costumes, ao modo de um povo culturalmente pensar. Tem por característica
principal a interiorização, já que não precisa ser exteriorizada.
Acerca do conhecimento da moral, Hommerding (HOMMERDING,
Adalberto Narciso. Valores, Processo e Sentença. p. 36) referencia que para Max Scheler os valores
são conhecidos apenas através do sentimento. Assim, o órgão para a apreensão
dos valores não seria o entendimento, mas o sentimento, pois é no sentir
emocional que se tem a vivência direta dos valores.
Já para Honecker e Lotz,
os valores são apreendidos pelo intelecto, conforme cita Johanner Hessen uma
passagem do primeiro: “podemos dizer que todo o valorar é, na essência, um
facto intelectual no qual o sentimento apenas intervém como um factor
concomitante ou que apenas lhe serve de fundamento” (Apud HOMMERDING,
Adalberto Narciso. Valores, Processo e Sentença. p. 36).
Hessen, por sua vez,
critica o exagerado intelectualismo, afirmando que se assim fosse, os mais
altos intelectos deveriam ser portadores dos maiores valores, tais como a ética
e a justiça, o que se sabe não acontece. Segundo este autor, os valores não se
fundam num conhecimento racional-discurssivo, mas são conhecidos a partir de
numa vivência direta.
De outro lado e com uma posição central, David Hume
(Uma
investigação sobre os princípios da Moral. p. 174) afirma que a Moral funda-se tanto na razão
quanto no sentimento, na medida em que é através da razão que se conhece as
várias tendências das ações (se nocivas e úteis), mas cabe ao sentimento
estabelecer a preferência entre uma e outra ação, no caso, as úteis em
detrimento das inúteis.
Por fim, explica Calera (Apud DIAS, Maria da Graça dos Santos. A
justiça e o imaginário social, p. 45-46) que “a liberdade de
aceitação, de adesão, constitui
a característica fundante do ato Moral”.
A Ética, por sua vez, “é a
disciplina que procura responder as seguintes questões: como e porque julgamos
que uma ação é Moralmente errada ou correta? E que critérios deve orientar esse
julgamento?” (BORGES, Maria de Lourdes. Ética. p. 7).
Tem por característica ser
atributiva, exteriorizada e por função estetizar as relações humanas e
estabelecer limites ao agir.
Vê-se, portanto, que a
Ética tem como função principal tornar as relações humanas mais belas, sendo,
em última análise, a Moral em ação. Assim, a Ética pressupõe um agir individual
buscando o bem, direcionado ao outro.
A Ética, por não ter a
característica de exigibilidade, necessita da força imperativa do Direito. É a
Ética quem vai, ou pelo menos deveria, conduzir o Direito.
Adão Longo (op. cit. p. 73)
sintetiza:
A Ética deverá estar presente no
homem: em todos os seus atos, gestos, ou pensamentos, ou faculdades, ou
interpretações ou decisões. O homem é, embrionariamente, um ser ético: na sua
razão pura, na sua vontade consequente, na origem de sua ação e na consecução
de seus objetivos e finalidades (...). Porque o homem é destinado, por
natureza, à Ética, num compromisso tácito com a vida que lhe é dada viver,
condicionando o ar que respira ao direito de posse de sua dignidade. É esta
dignidade que irá fundamentar a justiça das normas jurídicas, na sua elaboração
ou julgamento, e que dará consistência ao corpo necessário das leis e dos
códigos.
E prossegue: “Eis por que,
encarados isoladamente, a Ética e o Direito não existem verdadeiramente: são,
respectivamente, alma e corpo de uma vida humana” (p. 74).
Foi visto acima que a Ética
tem como função estetizar as relações humanas, bem como estabelecer limites ao
agir. Sobre a primeira função, basta afirmar que ao tornar as relações humanas
mais belas a Ética sempre estará relacionada com o bem, com o agir altruísta,
não sendo ético o comportamento que não tenha este objetivo.
Já no tocante à limitação
do agir, tem grande importância para as relações humanas e principalmente para
o Direito, que deve estar sempre intimamente ligado com a Ética e limitado por
esta.
A virtude
Platão simboliza a virtude
como unidade, semelhante a um bloco monolítico, composto por três faces:
justiça, sensatez e piedade.
Este filósofo trabalha a virtude em dois aspectos. A intelectual e a de ofício,
ou de habilidades técnicas.
A virtude intelectual é
percebida por meio de duas modalidades: moral e política. Para Platão, a
virtude moral equivale ao bem, no sentido da moral, em sua dimensão mais
elevada. A virtude política, por sua vez, define-se pela vontade da lei e
ambas, virtude moral e política, têm por objetivo alcançar o progresso
espiritual do homem e são construídas sob o paradigma do bem e caminham em
direção à luz, ao conhecimento e à verdade.
Em suma, a virtude
intelectual deriva do estudo do conhecimento humano gerado a partir de
pesquisas-reflexões sobre determinado ramo de saber.
A virtude moral compreende
a humildade, a prudência, a justiça, a coragem, a sinceridade, o amor, nasce
individualmente do homem e pode ser considerada universal, pois inerente ao ser
humano.
Para Aristóteles, a virtude
moral nasce do hábito, do costume dos povos. Constituem formas concretas da
virtude moral a coragem, a prudência, a humildade, a magnanimidade e a
temperança.
Já a virtude intelectual, que denomina de excelência, apóia-se na experiência e
no tempo, nasce e se aperfeiçoa com a instrução e produz ideias universais.
Portanto, é algo que pode ser aprendido através do conhecimento teórico e
empírico, uma combinação entre o conhecimento teórico e a experiência.
A virtude de ofício, para
este filósofo, é resultante de uma profissão e não é submetida ao um
conhecimento intelectual. É limitada ao trabalho dedicado, não é universal, mas
limitada ao particular. Pode-se entender por esta virtude o ofício desenvolvido
pelo artesão, pelo pintor, pelo marceneiro, alfaiate etc. cujas capacidades
lhes são inerentes, inatas muitas vezes, constituindo-se, assim, uma virtude
pessoal.
Em suma, pode-se
classificar a virtude, conforme leitura de Platão e Aristóteles, em Virtude
Moral, Virtude Intelectual e Virtude de Ofício.
Moacyr Motta da Silva,
explicando o pensamento de Max Scheler, reprisa que para este autor a virtude
indica a ideia do bem, como consciência viva, inerente ao ser humano,
individual e pessoal. Virtude, por este entendimento, constitui particularidade
do ser humano.
E prossegue:
Scheler inicia a ideia de virtude
como potência do ser humano voltada para o bem. O termo potência designa estado
do ser, do ângulo da moral. A palavra bem, na linguagem da virtude em Scheler
denota aquilo que pode ser objeto de satisfação e de aprovação. O conceito de
virtude independe do grau de capacidade, de habilidade. A virtude, como potência
íntima do ser, concretiza-se em atos de amor, de boa vontade, de compreensão e
de nobreza interna.
Para Adão Longo a virtude é
abstrata, abstraída das ações, das qualidades ou dos estados que vivem na
realidade do mundo e apesar de ser uma potência individual do ser, necessita
das relações entre os seres humanos para vivificar:
A coragem, a honradez, a temperança,
a amizade, a caridade, a franqueza, a sinceridade, o amor, a piedade, e as
demais virtudes, no são somente possibilidades de cada ser humano, encaradas
simploriamente como aspirações próprias, individualizadas, mas devem ser
percebidas, acima de tudo, como essências das relações de vida, que brotam dos
indivíduos, mas que só germinam e se plantam com suas raízes firmes quando
arborescem por inteiro nas relações humanas, que se fazem relações públicas e
morais, para frutificarem no Direito.
Pode-se compreender por
virtude a ação do homem no sentido do bem, voltado àquilo que é bom no outrem.
Esta ação deve ser consciente e com liberdade, sem influenciação do grupo a que
pertence.
Contudo, a virtude estudada
a partir da Idade Média não corresponde à virtude atual.
Na Idade Média, a virtude
era vista como uma essência das mais elevadas, a primeira qualidade da pessoa.
Apontava para uma consciência viva de potência para o bem e era
totalmente individual e pessoal.
Na atualidade a virtude é
vista como algo que ultrapassa, está distante do homem. Hoje se fala de
habilidade nos negócios e empreendimentos em substituição à virtude. Aquela concepção
de virtude é algo inalcançável, segundo a crença atual.
Essa visão, logicamente,
deve ser modificada, o que só ocorrerá a partir do reencontro do homem com a
humildade e a veneração. Segundo Scheler,
a busca destes dois representantes da virtude antiga é o caminho para a sua
reabilitação.
Por isso da necessidade de
se analisar a virtude, pois é a partir dela (virtude moral e intelectual) que
se chegará à justiça.