terça-feira, 21 de maio de 2013

Diferenciando Renúncia de Decadência


A renúncia e a decadência são causas de extinção de punibilidade (art. 107 CP), aplicáveis aos crimes de ação penal privada, no primeiro caso, e privada e pública condicionada, no segundo.
Apesar de institutos distintos, mas por terem o mesmo efeito, a renúncia e a decadência acabam por não ser diferenciados adequadamente.
A decadência (e aqui trataremos apenas dos crimes de ação penal privada) ocorre quando o ofendido não oferece a queixa crime no prazo de 06 meses, a contar do conhecimento do autor do fato. É uma negligência da vítima, que por opção ou descuido não exerce o direito de ação.
A renúncia, por sua vez, ocorre quando o ofendido opta por não exercer o direito de queixa crime e, portanto, só se da antes do oferecimento da ação, logicamente.
Sim, mas se ambas se configuram pelo não oferecimento da queixa, qual a diferença, então?
A diferença é que na decadência deve haver a omissão do ofendido, que por ficar inerte deixa transcorrer o prazo decadencial sem interpor a ação penal.
Já a renúncia, apesar de aparentar uma omissão por parte do ofendido, caracteriza-se por sua postura ativa (renúncia tácita e renúncia expressa). A primeira ocorre quando o ofendido pratica atos (veja, age ativamente) incompatíveis com a intenção de processar o autor do fato, como, por exemplo, mantém amizade íntima ou relacionamento amoroso mesmo após a prática do crime. Já a renúncia expressa é a manifestação escrita, onde o ofendido renuncia ao direito de queixa.
Portanto, a principal diferença entre elas é que na decadência o ofendido se omite e na renúncia o ofendido pratica algum ato que demonstra sua real intenção em não processar.
A confusão pode aumentar quando o ofendido apresenta a queixa crime apenas contra um dos autores do crime: “A” e “B” praticaram o crime contra “C”, e este oferece a queixa apenas contra “A”.
Pelo princípio da indivisibilidade, não pode o ofendido “dividir” a queixa crime e deixar um dos autores do fato de fora. O artigo 49 do CPP garante que a renúncia ao exercício de queixa, em relação a um dos autores do crime, a todos se estenderá, ou seja, oferece a queixa contra ambos ou não processa ninguém.
Neste caso o ofendido, por ter se omitido em relação ao “A” (não ter oferecido a queixa contra ele), deu causa a renúncia que se estende também ao “B”.
Então temos um caso de renúncia por omissão, já que não praticou nenhum ato (tácito ou expresso)? Mas isso não seria decadência?
Realmente, há uma confusão legislativa neste sentido, posto que em se aceitando a renúncia no caso de omissão (como o narrado acima), esta se confundiria com a decadência.
Como resolver este problema? Pela atual legislação, não há como. O que impede isso é a indivisibilidade da ação penal privada. Se não houvesse a indivisibilidade, poderíamos ter a coexistência de renúncia e decadência: “A” e “B” praticam crime contra “C”, o qual, antes dos 6 meses renuncia (tácita ou expressamente) o direito em relação a “A”. Passados os 6 meses e não tendo “C” oferecido a queixa contra “B”, ocorreria para este a decadência.
Contudo, na atual legislação, isso não é possível, acarretando uma confusão conceitual entre decadência e renúncia.

terça-feira, 7 de maio de 2013

Pela NÃO redução da maioridade penal


Um jornal local me enviou algumas perguntas sobre a febre do momento nos meios de comunicação: A redução da maioridade penal. 

Abaixo seguem as respostas, apenas para conhecimento de quem se interessa pelo assunto:

1 – É notável hoje a grande participação dos adolescentes em crimes. Quais são a maioria dos delitos cometidos por ele?

R: A grande maioria dos atos infracionais praticados por adolescentes é contra o patrimônio, sem violência contra a pessoa, portanto infrações leves. Segundo pesquisa realizada em São Paulo, apenas 5% dos atos praticados podem ser considerados hediondos. O que vemos hoje na mídia é uma manipulação da informação, já que apenas os atos graves são noticiados, como que de forma pontual. Basta observarmos a nossa região, qual é a quantidade de atos infracionais praticados por adolescentes? pequena, mas se um adolescente matar alguém, logo isso vira notícia e a sensação falsa de que isso é corriqueiro e está aumentando é passada por alguns setores "mal intencionados". Portanto a primeira parte da pergunta não é verdadeira, pois não há um aumento na participação de menores em atos infracionais, o que há é um noticiário maior e com o objetivo de passar a sensação de insegurança coletiva.

2 – Você acha que a redução da maioridade penal iria contribuir para a diminuição dos crimes cometidos por adolescentes?

R: O grande equívoco de quem não estuda o Direito Penal como ciência é achar que ele reduz a criminalidade. Este pensamento é absolutamente falso. Na verdade o direito penal reproduz muito mais violência do que a elimina. Nos últimos 20 anos tivemos um aumento de encarceramento de quase 5 vezes, hoje contamos com mais de 500 mil presos. Neste mesmo período a criminalidade não diminui, pelo contrário, aumentou. Isso demonstra que a redução da criminalidade não passa pelo encarceramento, mas sim por outras questões que não cabe ao direito penal resolver. Portanto, sustentar que com a diminuição da maioridade penal os atos infracionais praticados por adolescentes (que então passariam a ser crimes) irá diminuir, é uma afirmativa incorreta, sem base alguma, e é sustentada muito mais pelo calor de algum fato isolado, do que com a razão. Este assunto não pode ser enfrentado com a emoção (respeito o sentimento de quem foi vítima de adolescentes infratores), mas sim com a razão. E o que a razão, o estudo, a pesquisa séria nos mostra? Que o direito penal não é o instrumento apropriado para reduzir criminalidade, não é com o encarceramento que se resolve a questão criminal. O nosso sistema penal não melhora ninguém, e colocar o menor neste sistema não trará nenhum benefício para ele e sequer para a sociedade, que logo terá que recebê-lo pior do que antes.

3 – Muitas vezes, tentam apontar o adolescente como responsável por um crime cometido por um adulto. A diminuição não seria importante para mudar isto?

R: Isso não é justificativa para reduzir a maioridade penal. Se pensarmos assim, iremos reduzir para 16 anos, então irão indicar que um menor de 16 foi o autor do ato. Reduziremos para 14, e logo indicarão que um menor de 14 foi o autor. Portanto, este argumento não se sustenta.

4 – Você acha que apenas as medidas socioeducativas podem “mudar” os adolescentes infratores? O que falta para isso acontecer no Brasil?

R: O Brasil tem um dos melhores Estatutos da Criança e do Adolescente do mundo, mas por que não funciona, por que não é aplicado. Não há sequer locais apropriados para os menores serem acompanhados, não há estrutura para ajudar o menor infrator. O Estado é omisso neste ponto. Se aplicarmos o que já existe, mas aplicarmos com eficiência, certamente teríamos uma diminuição na prática de atos infracionais. Pesquisas sérias indicam que nas instituições que se aplica o ECA, a reincidência é muito menor do que nos locais onde o ECA não é aplicado. Portanto, antes de pensarmos em reduzir a maioridade penal, de aplicar o direito penal aos menores de 18 anos, deveria o Estado esgotar todas os recursos preventivos, o que não faz. O direito penal só deve ser aplicado quando todos os demais sistemas de contenção falharem. E ninguém desconhece que o Estado não tem feito o mínimo no caminho preventivo. Nem mesmo clínicas públicas para tratamento de dependentes químicos existe de forma suficiente, e sabemos que muitos atos ilegais são decorrentes do uso de drogas.