quarta-feira, 7 de maio de 2014

A absurda "insignificância" nos crimes fiscais é até 20 mil (STF) ou 10 mil (STJ)?

O STF, ao julgar o HC 118.067/RS, em 25/3/14, reconheceu a insignificância nos crimes contra a ordem tributária para valores sonegados abaixo de R$ 20.000,00:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS IMPETRADO CONTRA ATO DE MINISTRO DE TRIBUNAL SUPERIOR. COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL: ART. 102, I, “I”, DA CF. MATÉRIA DE DIREITO ESTRITO. DESCAMINHO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICABILIDADE. HABEAS CORPUS EXTINTO. ORDEM DEFERIDA DE OFÍCIO.
1. (...);
3. No crime de descaminho, o princípio da insignificância é aplicado quando o valor do tributo não recolhido aos cofres públicos for inferior ao limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), previsto no artigo 20 da Lei 10.522/02, com as alterações introduzidas pelas Portarias 75 e 130 do Ministério da Fazenda. Precedentes: HC 120.617, Primeira Turma, Relatora a Ministra Rosa Weber, DJe de 20.02.14, e (HC 118.000, Segunda Turma, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, DJe de 17.09.13)

A tese adotada pelo Supremo é de que o valor que era de R$ 10.000,00 para as execuções fiscais, portanto o piso para ser considerado como insignificante, foi alterado para R$ 20.000,00, pelas Portarias 75 e 130 do Ministério da Fazenda.

Esta decisão do Supremo reformou decisão do STJ, que naquele caso havia aplicado o piso de R$ 10.000,00, e afastada a insignificância.

Contudo, o STJ, em 25/4/14, ao julgar o REsp 1395052/SP, tendo como denunciado o ex-senador Luiz Estevão, voltou a afastar a insignificância para débitos tributários acima de R$ 10.000,00 e abaixo de R$ 20.000,00:

RECURSO EM ESPECIAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA TRIBUTÁRIA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. MANUTENÇÃO DO PARÂMETRO DE R$ 10.000,00 (DEZ MIL REAIS). INAPLICABILIDADE DA PORTARIA N. 75/2012 DO MINISTÉRIO DA FAZENDA. RECURSO DA MINISTERIAL PROVIDO.
1. A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou compreensão no sentido de que os débitos tributários que não ultrapassem R$ 10.000,00 (dez mil reais), nos termos do art. 20 da Lei n.º 10.522/02, são alcançados pelo princípio da insignificância, entendimento que deve ser estendido aos crimes de apropriação indébita previdenciária, tendo em vista que a Lei n.º 11.457/2007 passou a considerar como dívida ativa da União também os débitos decorrentes das contribuições previdenciárias, dando-lhes tratamento similar aos débitos tributários.
2. Todavia, não é possível a aplicação do parâmetro de R$20.000,00 (vinte mil reais) trazido na Portaria n. 75/2012 do Ministério da Fazenda para reconhecer a insignificância nos delitos de descaminho, haja vista a inadmissibilidade de se alterar lei em sentido estrito por meio de portaria, a instabilidade de se vincular a incidência do direito penal aos critérios de conveniência e oportunidade que prevalecem no âmbito administrativo, a inadequação de se criar critério absoluto de incidência do princípio da insignificância e a irretroatividade do referido patamar.

O entendimento do Ministro Bellizze é no sentido de que o limite de R$ 20 mil instituído pela Portaria 75 do Ministério da Fazenda não pode ser usado para justificar a aplicação da insignificância penal, em vista da impossibilidade de se alterar lei em sentido estrito por meio de portaria. Além disso, o ministro considerou que seria um fator de instabilidade vincular a incidência do direito penal aos critérios de conveniência administrativa no âmbito tributário.

O primeiro argumento, a meu ver, está correto, sem falar na quebra da isonomia, se pensarmos que os crimes patrimoniais não tem limite mínimo para ser reconhecida a insignificância, podendo e muitas vezes até sendo afastada a insignificância em subtrações, apropriações indébitas, receptações ou estelionatos cujo valor do bem (prejuízo da vítima) é irrisório.

Certamente caberá ao Supremo a última palavra sobre o tema, com o diferencial que neste caso terá que enfrentar uma tese ainda não apreciada pela corte, se a Portaria do Ministério da Fazenda pode alterar lei ordinária (aprendemos, desde os primeiros dias do curso de Direito, que não pode, mas....)

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