quarta-feira, 22 de agosto de 2012

GUARDA MUNICIPAL: retornando ao tema


  Já me manifestei em outra ocasião sobre como a Guarda Municipal de Balneário Camboriú vem repetidamente usurpando função pública (crime do artigo 328 do CP) e cometendo abuso de autoridade (crime do artigo 4º, alíneas b e h da Lei 4.898/65) ao praticar atos de policiamento ostensivo/preventivo, exclusividade da Polícia de Segurança (Polícia Militar), conforme definido no artigo 144 § 5º da CRFB/88.

  Também já presenciei guardas municipais de Balneário Camboriú, de arma em punho, abordando um veículo e fazendo a vistoria pessoal nos condutores e vistoria no próprio veículo, sem nada ter encontrado (ressalto que a busca pessoal é função da polícia judiciária e da polícia preventiva e é um ato que exige a fundamentação da autoridade competente a executá-la (artigo 240 § 2º do CPP).

  Salientei que a função da Guarda Municipal está delineada e delimitada pelo artigo 144 § 8º da CRFB/88: “Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei”, ou seja, ela somente pode proteger os bens, serviços e instalações do município e nada mais.

  Pode a Guarda Municipal agir em caso de flagrante delito porque esta é uma prerrogativa que o artigo 301 do CPP faculta a qualquer pessoa do povo, contudo fora da flagrância (art. 302 do CPP) somente pode atuar nos limites constitucionais.

  Retorno ao tema em virtude de questionamentos formulados em sala de aula por alunos, os quais indagaram se a Guarda Municipal pode agir conjuntamente com a Polícia Militar no policiamento ostensivo/preventivo (blitz, busca pessoal etc.), em razão do excesso de demanda e do déficit de efetivo da PM, no que chamam de cooperação.

  Repondo a pergunta com outra indagação: 

  • é possível o Delegado de Polícia, alegando excesso de serviço e déficit de pessoal delegar ao comandante da Polícia Militar a realização de inquérito policial?

  Logicamente que não!

  Se a Constituição Federal delimitou a função da Guarda Municipal, nenhuma outra lei infraconstitucional poderá dar poderes além daqueles previstos na Carta Política, muito menos a Polícia Militar poderá delegar sua função à Guarda Municipal. Não se delega função pública a quem não tem.

  O particular, caso seja abordado pela Guarda Municipal e não esteja em situação de flagrância delito, tem o direito de recusar-se a se submeter à revista pessoal ou que seu veículo seja revistado, eis que não está obrigado a seguir ordens ilegais e abusivas.


Um comentário:

Fabiano Oldoni disse...

Segue recente decisão do TJPR que reconhece como ilegal a prática, pela Guarda Municipal, de atos de polícia preventiva ou judiciária:

APELAÇÃO-CRIME. PORTE ILEGAL DE ARMA. RÉU DENUNCIADO COMO INCURSO NO ART. 14 DA LEI 10.862. PROVA ILÍCITA. ALEGAÇÃO DO APELANTE DE QUE OS INDÍCIOS QUE SUSTENTAM A CONDENAÇÃO DERIVAM DE PROVA ILÍCITA. GUARDA MUNICIAL EXCEDE COMPETÊNCIA REALIZANDO BUSCA PESSOAL MESMO SEM HAVER FLAGRANTE DELITO. RECURSO PROVIDO
1. No caso em tela o que observamos é diligência de guarda municipal em realizar busca pessoal no acusado, o que levou à prisão em flagrante deste. Questiona-se se tal prática excede a constitucionalmente atribuída competência da guarda municipal ou se trata de ação legalmente aparada pelo caso excepcional do flagrante delito.
2. Ocorre que a busca pessoal realizada pela guarda municipal, embora frutífera em encontrar arma de fogo na posse do acusado, se deu sem que houvesse fundada suspeita ou certeza visual de que o acusado estivesse a praticar delito. Dessa sorte, tal abordagem se deu em descompasso ao disposto no art. 144 da Constituição Federal, sendo prática ilícita, e, por assim ser, consequentemente, apenas capaz de gerar prova ilícita.

3. Não houve a prisão em flagrante e depois a busca pessoal com a apreensão da arma, mas, ao contrário, primeiro houve a revista pessoal e apreensão da arma e, posteriormente, a prisão em flagrante - inclusive porque nenhum dos guardas municipais perseguia o réu em razão de prática de ilícito, mas apenas "desconfiaram" do mesmo e em razão de tal desconfiança houve a busca pessoal com apreensão da arma na mochila daquele, que, então, gerou a prisão em flagrante do acusado por portar ilegalmente arma de fogo.

4. Acertado afirmar que guarda municipal, a teor do disposto no § 8º, do art. 144, da Constituição Federal, tem como tarefa precípua a proteção do patrimônio do município, limitação que não exclui nem retira de seus integrantes a condição de agentes da autoridade, legitimados, dentro do princípio de autodefesa da sociedade, a fazer cessar eventual prática criminosa, prendendo quem se encontra em flagrante delito, como de resto facultado a qualquer um do povo pela norma do art. 301 do Código do Processo Penal. Contudo, no caso em tela não houve atuação em defesa da sociedade para fazer cessar eventual prática criminosa, mas sim busca pessoal imotivada.
5. Se toda a prova reunida no processo e que deu sustentação à procedência da acusação, foi obtida mediante infração a normas de natureza constitucional e processual, essa ilicitude torna o conjunto probatório inutilizável, decorrendo daí a necessidade de absolvição do apelante, senão a restrição constitucional da prova ilícita de nada valeria (TJPR - Processo: 8303891 - Julgamento: 22/03/2012).